terça-feira, 24 de maio de 2011

A OAB-SP e a Campanha do Desarmamento

Fiquei triste esta manhã, quando ao ler o Jornal do Advogado deste mês de Maio/2011, me deparei com matéria do Sr. Presidente da OAB-SP, Luiz Fĺavio D'Urso, apoiando de forma efusiva a mais recente Campanha do Desarmamento.

Minha tristeza advém do fato de que, neste momento em que vivemos uma crise de cerceamento de direitos civis, a principal entidade com legitimidade para defender estes direitos, se volta contra os mesmos.

Diz o Sr. Presidente: “...é urgente criar e veicular amplas campanhas que efetivamente conscientizem a população sobre a necessidade do desarmamento e do controle rigoroso de armas de fogo e munições”.

Ora, onde será que o Sr. Presidente esteve nos últimos anos? Se estivesse acompanhando a realidade brasileira, veria que hoje é muito mais fácil se comprar um quilo de cocaína, do que uma arma legalizada. Em minha cidade de Araraquara, não se tem notícia de absolutamente NENHUM cidadão que tenha obtido seu porte de arma. Nenhum.

Os pobres coitados que acorreram à Polícia Federal na última campanha do desarmamento, e legalizaram suas armas gratuitamente, agora serão punidos com pena de confisco, de vez que terão que gastar 30 vezes o valor de sua arma, se quiserem apenas e tão somente mantê-las na legalidade. Sim, exatamente isto. O Estado está pagando R$ 100,00 pela arma entregue pelo cidadão, enquanto a renovação da licença da mesma arma, não custará menos do que R$ 3.000,00, no que está incluído Exame Médico e Psicotécnico, curso de tiro, prova de proficiência, e taxas. Por isto a lei que rege a matéria se chama Estatuto do Desarmamento.

Quem não arcar com todas estas despesas, estará na ilegalidade, e mais, agora a sua arma consta no SINARM, então ele responderá automaticamente por crime de posse de arma de fogo. Vale dizer, já existem cidadãos respondendo criminalmente, apenas por não terem renovado sua licença.

Mais à frente, matéria de centro coloca uma pequena seção de perguntas e respostas, que tem como fonte o Ministério da Justiça, onde existem diversos procedimentos que violam a legislação, e mostram números que sabemos serem falsos, que apontam para uma diminuição da criminalidade devido ao “sucesso” da última campanha de desarmamento.

Vejamos.

Diz-se que o cidadão poderá indistintamente entregar arma com ou sem registro. Ora, ter uma arma sem registro hoje é crime, e a autoridade que receber uma arma sem registro sem dar ordem de prisão ao cidadão, estará ela mesma sujeita a responder por crime de prevaricação. Notem que não existe nenhuma lei revogando, ainda que temporariamente, o crime de posse de arma de fogo sem registro.

Mais à frente, se afirma que se emitirá guia de tráfego da arma, mesmo daquela arma não registrada. Novamente, a simples emissão desta guia de tráfego implica em crime de prevaricação, nenhuma autoridade pode emitir guia de tráfego de uma arma não registrada.

Naquela seção, não se esclarece se o cidadão deve tirar uma guia de tráfego para transportar sua munição, dando a entender que nada se precisa fazer a respeito, o que viola especificamente o artigo 14 do Estatuto do Desarmamento. O cidadão que aparecer em uma delegacia da Polícia Federal com munição, ainda que apenas e tão somente com a munição, achará que está exercendo um ato de cidadania, mas na verdade estará cometendo um crime. Este cidadão não poderá se eximir da sua culpa alegando desconhecer a lei, porque isto é vedado no Brasil. Tampouco poderá alegar estar seguindo orientações publicadas na imprensa, porque a imprensa brasileira AINDA não faz leis. Este cidadão tem que ser preso em flagrante, e a autoridade que deixar de fazê-lo, poderá receber ordem de prisão de qualquer do povo que presenciar o fato (art. 301 do Código de Processo Penal). Deve ser muito interessante um cidadão dar ordem de prisão a um Delegado da Polícia Federal, dentro de uma delegacia da DPF.

Vejam bem, eu não escrevi a lei. Estou apenas transcrevendo o que está escrito. A atual campanha do desarmamento, no formato divulgado, viola a lei, e implica na prática de crime por parte de cidadãos e autoridades.

A OAB, entidade que suporta a tese constitucional de que o advogado é essencial ao exercício da justiça, não pode dar azo a tais ilegalidades, nem muito menos divulgá-las em seu órgão oficial.

Por outro lado, deveria defender os direitos civis do cidadão, entre os quais, o de ter e portar uma arma de fogo, se assim bem entender. Ora, quando eu defendo o Direito de Liberdade Religiosa, e o faço em nome da denominação a que pertenço, estou implicitamente defendendo o direito de outras religiões à mesma liberdade, ainda que preguem doutrinas com as quais eu não concorde.

A advocacia, ao defender um acusado de crime, não está defendendo o crime em si, mas sim protegendo os direitos fundamentais do acusado, ainda que o mesmo seja culpado.

Da mesma forma, não se pede ao Sr. Presidente da OAB-SP, que mude seu ponto de vista quanto ao desarmamento. Ele tem todo o direito de não ter e não portar armas, exatamente pelo mesmo motivo que o cidadão tem o direito de ter e portar sua arma (ainda que não consiga exercê-lo). O importante é que a advocacia não pode defender teses antidemocráticas, nem o cerceamento aos direitos civis. Bem pelo contrário, a advocacia é o último bastião na defesa destes direitos, e deve se erguer ativamente contra os desmandos do Estado, mesmo e até quando o operador do Direito, pessoalmente, não se sinta ameaçado.

Um comentário:

xykomack disse...

Ridícula essa afirmação do nosso presidente de conselho. Me envergonho de ter votado nele. Nós advogados passamos a vida estudando e nos atualizando, para ouvir isto? Todo advogado sabe que não há direito sem garantias. De que valem anos ou décadas de disputas judiciais em discussões detalhadas sobre um mínimo direito de indenização cível se lá na rua prevalece a lei do cão, onde não há direito algum sequer à vida, bem mais precioso? A impunidade é tão gritante que a polícia basicamente só descobre culpados por denuncia anônima, e mesmo flagrantes são só uma fração dos chamados, pois hoje policiais não querem enfrentar bandidos, com medo de consequências. E nesta situação ainda há advogados que defendem que o cidadão não tem sequer o direito de escolher se pode ou não se defender? Advogados deveriam defender direitos, não seu cerceamento pelo estado. E se algum índice de homicídios, todos controlados pela secretaria de segurança, diga-se de passagem, supostamente diminuiu, foi unicamente em São Paulo e porque ali se está investindo absurdamente em segurança, valor que um país de terceiro mundo não poderia estar dispendendo assim. Deixe o cidadão de bem se defender e a impunidade acaba, como na Suíça, por exemplo.