segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Sobre pilotos e juízes

        Em 2003 eu estava vivendo um período negro da minha história, e meu pai telefonava nos domingos pela manhã, era o nosso bate-papo semanal.

        A conversa sempre começava do mesmo jeito, eu o cumprimentava - Fala, véio! - e ele sempre me respondia - Véio é a sua vó!!!...

        No início de agosto, num dia qualquer eu vi o nome do meu pai no identificador de chamada, e sabia que alguma coisa estava errada – ele não era de gastar com uma ligação telefônica por qualquer coisa. Atendi, e uma pessoa estranha me perguntou se eu era o filho do Adalberto.

        Não me lembro de ter tomado outra porrada assim na vida.

        Simplesmente fui informado de que meu pai, sua terceira esposa e minha linda meia irmã de apenas seis anos de idade tinham falecido.

        Fui de Araraquara para São Paulo, onde peguei um voo para Palmas no Tocantins.
        
       Depois de embarcados, com uma demora de alguns minutos o comandante nos informou que solicitou troca do avião. Muitos passageiros reclamaram, mas fomos para outro jato.

       Durante a subida nos informou que durante o abastecimento do avião que ficou em solo o computador de bordo havia indicado o tanque cheio, porém o relatório do piloto anterior indicava que o avião não havia sido abastecido. O comandante então preferiu acreditar no relatório do outro piloto do que no computador do avião que, diga-se de passagem, era novíssimo.

      Lembro-me muito bem do que eu disse para a minha irmã naquele momento: -"Graças a Deus aeronaves são comandadas por pilotos, e não por juízes".

        Como piloto e como Bacharel em Direito eu conheço muito bem a diferença. 

Trecho de "A obsolescência do homem"

 ′′Para sufocar antecipadamente qualquer revolta, não deve ser feito de forma violenta. Métodos arcaicos como os de Hitler estão claramente ultrapassados. Basta criar um condicionamento coletivo tão poderoso que a própria ideia de revolta já nem virá à mente dos homens. O ideal seria formatar os indivíduos desde o nascimento limitando suas habilidades biológicas inatas...

Em seguida, o acondicionamento continuará reduzindo drasticamente o nível e a qualidade da educação, reduzindo-a para uma forma de inserção profissional. Um indivíduo inculto tem apenas um horizonte de pensamento limitado e quanto mais seu pensamento está limitado a preocupações materiais, medíocres, menos ele pode se revoltar. É necessário que o acesso ao conhecimento se torne cada vez mais difícil e elitista..... que o fosso se cave entre o povo e a ciência, que a informação dirigida ao público em geral seja anestesiada de conteúdo subversivo. Especialmente sem filosofia. Mais uma vez, há que usar persuasão e não violência direta: transmitir-se-á maciçamente, através da televisão, entretenimento imbecil, bajulando sempre o emocional, o instintivo.

Vamos ocupar as mentes com o que é fútil e lúdico. É bom com conversa fiada e música incessante, evitar que a mente se interrogue, pense, reflita.

Vamos colocar a sexualidade na primeira fila dos interesses humanos. Como anestesia social, não há nada melhor. Geralmente, vamos banir a seriedade da existência, virar escárnio tudo o que tem um valor elevado, manter uma constante apologia à leveza; de modo que a euforia da publicidade, do consumo se tornem o padrão da felicidade humana e o modelo da liberdade.

Assim, o condicionamento produzirá tal integração, que o único medo (que será necessário manter) será o de ser excluído do sistema e, portanto, de não poder mais acessar as condições materiais necessárias para a felicidade. O homem em massa, assim produzido, deve ser tratado como o que é: um produto, um bezerro, e deve ser vigiado como deve ser um rebanho. Tudo o que permite adormecer sua lucidez, sua mente crítica é socialmente boa, o que arriscaria despertá-la deve ser combatido, ridicularizado, sufocado...

Qualquer doutrina que ponha em causa o sistema deve ser designada como subversiva e terrorista e, em seguida, aqueles que a apoiam devem ser tratados como tal′′

Günther Anders -  1956